Brasil Crónicas 5
Televisão- Dercy, a Casa dos Gordos e o Canal Boi
A televisão no Brasil é tão fascinante que merece o nosso maior reparo. Rangel e a SIC e outros canis privados não inventaram nada. Limitaram-se a copiar os canis (não é gralha) brasileiros em versão bisonha e mole. Os canis brasileiros também enchem os estúdios de palhaços, tipos vestidos de macacos, bailarinas seminuas, cantores de quinta ordem em mau play-back, captam imagens aos tombos para dar o ar de dinamismo e apostam também na mais despudorada vulgaridade. Mas há diferenças subtis.
Vejamos por exemplo o “Especial Dercy”. Dercy Gonçalves, uma artista gaiteira, celebrou em directo os seus 98 anos. Sim, 98! Em Portugal teríamos umas frases solenes (o nosso presidente é bom nisso) numa homenagem póstuma e muitas imagens de arquivo. No Brasil não! Dercy é desenvolta, enérgica veste plumas e brilhantes e vai revelando detalhes da sua vida sexual, a última tentativa de estupro aos setenta anos ou o túmulo de cristal em forma de pirâmide que encomendou há 10 anos e, por enquanto, continua vazio. Para prender a atenção dos espectadores chega subitamente às portas do estúdio uma ambulância, para a eventual reanimação de Dercy, dizem. O veículo vem cheio de Chippandales de tanga (um pouco como o país que Gueterres deixou a Durão Barroso, mas com mais animação). Colocam um sensor nos dedos da Dercy que logo ali ensaia com os moços um samba de roda. No ecrã acompanhamos o ritmo cardíaco de Dercy, talvez na expectativa de assistir a um ataque em directo.
Em vez da quinta das celebridades ou Big Brother há um perturbante reality show chamado “A casa dos gordos” onde um grupo de anafados tenta perder o máximo de quilos por semana. A expulsão é determinada pela combinação do voto do público e do peso perdido. Analia (ler Analía, por favor) consegue o feito de ficar até ao fim, emagrecer e arranjar um parceiro. Não há limites para a Analía. Mas tudo isto são versões tropicais do que nós por cá temos. Há no entanto um canal temático único e desconhecido no resto do mundo. Aproveito para fazer um apelo à TV Cabo para passar a difundir este canal o mais depressa possível. Chama-se “Canal do Boi”. De que trata? Pensaram os meus queridos amigos? Não trata. Vende. É um canal de televendas, mas de televendas de gado. A emissão divide-se em duas partes não muito distintas. Na primeira aparece uma rês em grande plano com os dados pessoais (enfim, animais): peso, idade, raça, proveniência. Um locutor em voz off vai gabando as qualidades do bezerro. “Reparem nestes quadris. Notem o perfil das culotes!” E conclui com a frase lapidar: “Olhem-me para este animal!” Por baixo desfila o telefone e o preço. Na segunda parte largam um grupo de vacas num pequeno curro. Um pouco como nas nossas touradas, quando o toiro não quer sair da arena e aparece um grupo de vacas para o levar dali para fora. Aqui as vacas entram também de roldão, mas não há touro para seduzir, apenas os eventuais telecompradores. As vacas dão umas voltas ao recinto, tristes e desmotivadas e aparentemente inconscientes da sua telegenia. Mais uma vez no ecrã passam dados técnicos: o peso médio, a fazenda de origem, etc. A voz off desta vez procede a um leilão, lançando alguns suspiros entre os lances. Isto é um bocado difícil de explicar, mas o Canal Boi não é apenas fascinante na sua monotonia. É hipnotizante! E se não fosse o Patrick a segurar-me tinha vindo carregado com alguns novilhos e bezerras. Assim se vê a força da tevê.
Mas não se esteja já a rir porque qualquer dia aparecer-lhe-á isto em directo num canal perto de si: “Cagar da Vaca”. Passo a transcrever do jornal para não dizerem que ando a inventar: “Roleta alentejana. O povo de Terrugem acaba de inventar uma nova modalidade de jogo para animar as festas. Chama-se “Cagar da vaca”. O chão da praça é dividido em quadrículas numeradas,como se fosse um tabuleiro de xadrez sobre as quais se fazem apostas. A quadrícula vencedora é onda a vaca defeca. A regra é simples mas requer paciência. O prémio é a própria vaca.”
Cenas do próximo capítulo - ... em seguida abraçava duas mulheres de biquini, corpulentas e pesadamente maquilhadas onde pendia outro letreiro : “Prostíbulo”
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