Postais da India - Xiitas
Bidar - Assistimos à cerimónia da manifestação do luto por Hussein, genro de Maomé martirizado em Kerbala no Iraque, onde os peregrinos ainda actualmente são massacrados ora por sunitas, ora pelos americanos que os protegem dos sunitas (é o grande dilema entre friendly e unfrendly fire no momento da morte).
Anualmente os xiitas entregam-se a manifestações de luto durante quarenta dias. No planalto do Decão comunidades xiitas de origem persa percorrem em transe as ruas num ritual de autoflagelação com as próprias mãos. A pele estala. O sangue escorre.
No Paquistão, em cerimónias semelhantes, homens flagelam-se com correntes e fazem sulcos no crânio com sabres. Aqui os mais piedosos apresentam escarificações nos ombros, marcas da flagelação anual. Adolescentes excedem-se numa manifestação de exibicionismo e necessidade de reconhecimento Os hindus olham em silêncio o cortejo.
Atrás as mulheres cobertas de negro cantam. A flagelação é neste caso menos fanática e excessiva. Sacodem o pó das costas com pouca convicção. As suas vidas já de si são bastante sacrificadas para seguirem a entusiasta mortificação masculina.
É impressionante? Claro que sim. São perigosos fanáticos? Creio que não. A nossa presença é mal vista? De forma nenhuma. Travo a tendência para condenar ou julgar.
A nossa relação com o corpo é aparentemente diferente. Na cultura cristã o corpo é uma evocação do corpo divino, crucificado. Todavia não posso deixar de pensar nos excessos do catolicismo na Semana Santa, nos peregrinos de joelhos em sangue em Fátima, nas carpideiras nos funerais. Por mais que queiram acentuar a fractura entre o islamismo e o cristianismo os pontos em comum são visíveis. Estar aqui não é procurar emoções fortes ou procurar o exotismo do National Geographic. Estou tão fascinado com esta mortificação do corpo como estou com o culturismo desmesurado, os piercings e as plásticas radicais.
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