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de todo mal que se disse só pecou quando foi brando

30.3.07

Salazar e os Amigos

O concurso do Maior Português sofre da ilusão democrática. A democracia não é um concurso. Escolher figuras históricas não é um acto de cidadania. Os nossos compatriotas estavam em casa enfadados com a vida, com o cônjuge de pantufas de flanela aos quadrados castanhos, fartos do naperon em cima da televisão e das facturas na terrina da sala. Num acto de protesto votaram no Botas. Mas é verdade. Não passa de um concurso para encher a linguiça da RTP. Juntaram aos salazaristas nostálgicos que fizeram desta votação um manifesto contra a impotência.

Mas já que estamos numa fase nostálgica e evocativa gostaria de lembrar 1977. Nesse ano a RTP para escolher a canção que esse ano nos representaria no Eurofestival optou, num arroubo democrático, pela escolha directa do público (na altura postais). Eram dez canções em liça. Quem se lembra da canção "Rita, Rita limão” ou os “Bric-a brac’”? Ninguém? Ainda bem. Do lote havia uma mais política (na altura tudo era política do bigode à patilha, do capote alentejano à samarra). A canção era uma versão festivaleira do canto de intervenção. Mas o pop e o festival sempre se deram mal com canções com mensagem. A canção todavia ganhou com uma grande volta de avanço; Porquê? Segundo consta nas sedes do PCP nunca se tinha gasto tanto dinheiro em postais. Mobilizou-se a militância e a canção ganhou.

O imediatismo democrático e da legitimidade popular era exactamente o mesmo. A ilusão que Portugal ainda era (em 77) um país revolucionário a cheirar a cravos foi perfeita. Assim “Portugal no coração” pelos “Amigos” foi cantarolar por essa Europa que ainda não estava bem connosco.

Quem eram estes “Amigos”? Paulo de Carvalho era a risca de um pijama. Ana Bola (parece a Manuela Bravo do Balão sobe, mas não é) era um frisado no cabelo ainda a cheirar a amoníaco. Fernando Tordo era uma barba cheguevariana. Luísa Babo (ou Gago ou Sargo) era uma figura de comício. O texto era bom? Tinha mensagem? Conteúdo?

Portugal quer dar as mãos, termos amigos termos pão.” “Portugal foi a razão, porque um dia morreu meu irmão”Bate, bate, coração a ouvir esta canção” Pelo menos a rima era rica. Havia até um momento fadista (perturbante) “ Portugal é querer acabar com a saudade”. Foi importante? Não. A Classificação foi boa? Claro que não. Mudou alguma coisa nas nossas vidas? Não. Mas deixou uma imagem de um país ainda um pedaço revolucionário, um pedaço de esquerda não alinhada e bastante piroso. Pois já na altura a guerra era de imagens.

Salazar nos tops é relevante? Não. Representativo? Nem por sombras. Mas a imagem que projecta (mais para fora que para dentro) mesmo que errada é de uma gente nostálgica, bisonha e, sobretudo, e com algum problema de fuso horário.

De 76 o que ficou? O arroubo fadista e as saias das cantoras. As SAIAS feitas de lenços do Minho com as franjas a adejarem. Quem as viu uma vez nunca mais se esquece. É isso que fica na memória. Daqui a 25 anos é isso que nos vamos lembrar do concurso da Maria Elisa, que por essa altura estará ainda muito mais nova. Para vos rememorar. aqui têm a canção . Reparem bem, mas mesmo bem nas saias feitas de lenços! Como diria a Antónia. Se se tiver que ilustrar o conceito “pindérico” são aquelas saias. E mais nada!

Link - para verem e ouvirem a canção. Mas não se sintam obrigados

"Este povo a que me dou não é homem nem mulher". Mas quem é que escreveu uma coisa destas?


1 Comentários:

Às terça-feira, 03 abril, 2007 , Blogger Sofia C. disse...

Genial!!! Adorei o teu texto!!! beijos,Sofia

 

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