TIREM-ME DESTE FILME

de todo mal que se disse só pecou quando foi brando

4.5.07

Tirem a Tonicha deste filme

A importância do certame (o que o povo na altura se pelava por um bom certame!) no Portugal dos anos sessenta era desmesurada. Por falta de outro tema o festival era um grande acontecimento, motivo de conversas apaixonadas e análises de especialistas e leigos. Discutiam-se as nossas hipóteses na Europa no antes e carpiam-se desagravos no depois.

Em 1969 a chegada da Simone depois da Desfolhada maltratada em Madrid, era uma multidão aos vivas e aos ais em Santa Apolónia. Em 1971 a Tonicha teve um acolhimento digno da Irmã Lúcia versão viva ou mesmo morta. A grande polémica girava à volta do vestido. Fialho Gouveia (ainda não era o Eládio Clímaco, o que pode parecer surpreendente) explicava à população maravilhada colada aos miseráveis ecrãs a preto e branco dos cafés as maravilhas do vestidito da Tonicha. A frase marcante era “Que pena os caros tele-espectadores não poderem ver as cores do magnifico vestido” A frase é já de si é um tratado filosófico digno da alegoria da caverna. Fialho chama a atenção dos espectadores para aquilo que eles não podem ver. Magnifico Fialho! E o povo acorreu ao aeroporto para aclamar Tonicha e indignar-se por ela não mostrar o vestido ali mesmo. Outros tempos em que as grandes questões nacionais eram de facto relevantes e, digamos, um pedaço fetichistas.
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Tonicha e su muchachos e muchachas ainda vestida de terylene e popeline

Tirem-me deste filme revela em primeira mão o segredo do vestido furta-cores. Tal como as crianças Von Trapp no filme Música no Coração, o polémico vestido da cantora, bem como os das matrafonas do coro, foram feitos com os cortinados de um palecete da Lapa. Aqui estão as provas.

E finalmente Tonicha acolhida no Aeroporto da Portela aproveita a ocasião para vender sabonetes Heno de Pradia para pagar a conta da costureira. Reparem no polícia do meio que em vez de reprimir a multidão canta entusiasmado "Rosa brava rosa povo, menina do alto da serra". Quando o aeroporto passar para a Ota vai ser a memória viva de um povo que se vai perder irremediavelmente.

Em Portugal substituímos as canções pelo futebol que preencheu o espaço de tudo o resto. Somos um país monofutebolístico. É pena. O festival em Portugal está com uma cotação abaixo de zero. Actualmente a pré-selecção parece um velório cantado num salão de festas da província. Noutros países ganhou uma dimensão kitsch e camp e invade os meios de comunicação como mais um grande episódio de um folhetim interminável. Tornou-se numa espécie de grande romagem à Nossa Senhora do Disparate e do Excesso. A vantagem é que o Festival é uma vez por ano e é relativamente inócuo. Alienação por alienação que seja festivaleira.

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