10 dias em Portugal
Primeiro dia
Lisboa. Estou indisposto. Vou ao Bonjour comprar um peixinho para cozer. Vou com um fato de treino e sapatos vela à falta de melhor. Com um pouco mais de energia teria ido passear para o Colombo e acabar de vez com a minha dignidade.
Segundo dia
Atravesso a Baixa para comprar roupa. Sou abordado dez vezes (10!) no espaço de 20 minutos por senhores aciganados a propor barras de chocolate que vendem como droga. Por onde anda a ASAE?
Terceiro dia
Visito a exposição temporária na Gulbenkian. Já não é de borla.
Quarto dia
Leio o artigo do Pacheco Pereira no Público a defender a guerra do Iraque e alegando que Bush foi enganado e agiu de boa fé. Volto à banca para devolver o jornal. Foi engano. Este tem pelo menos cinco anos.
Quinto dia
Finalmente percebo que as imagens que passam ininterruptamente nas televisões não são de um pas-de-deux entre duas paraplégicas mas sim um conflito entre a Carolina e a Micaela por causa de um telemóvel.
Sexto dia
Há qualquer coisa de museu a céu aberto no meu país.
Sétimo dia
Comentam-se piercings e cães perigosos. Podiam ter discutido corrupção, os atentados ambientais ou urbanos, enriquecimento ilícito ou as bolsas de pobreza. Mas não. O poder dos grandes grupos económicos abafa todas os níveis de jornalismo. Mais uns que acham que isto não é um país mas uma coutada.
Oitavo dia
Na Caparica compro um óculos de sol a uma vendedora brasileira de uma loja chinesa cujo patrão obviamente não sabe dizer duas seguidas. Um dia chegarei a casa e encontrarei uma loja chinesa na dispensa. A Zézinha Nogueira Pinto pretendia fazer um Chinatown. Não é preciso. O comércio em Portugal já está reduzido aos bazares chineses.
Nono dia
Em Mil Fontes tomo banho de mar. Tenho as pernas com uma bonita cor roxa alusiva à época pascal.
Décimo dia
Parto cedo para Bruxelas. Encontraram duas malas esquecidas no terminal da Portela. Accionam com invulgar moleza o plano de emergência. Fecham o aeroporto aos bochechos. Instala-se o caos. As malas esquecidas são destruídas duas horas depois com petardos e sem pré-aviso, sabendo a segurança do aeroporto que numa multidão compacta e ansiosa não há cardíacos nem acessos de pânico das massas. Chego a Bruxelas à hora em que se deitam as galinhas e os belgas.
Etiquetas: em festa
4 Comentários:
Belo retrato da pátria que já foi lusa, que a tantos serviu de musa e que agora já nem dá "tusa".
Ola Popeline,
Gosto de te ler mas confesso que nao alinho neste teu miserabilismo. Fiquei a saber que utilizas Chinatown como um insulto.Curioso... Um pouco estranho para quem se indigna com os desvarios anti-esquerdistas do governo sueco (que também acho preocupantes). Desculpa a franqueza, mas resolvi deixar aqui a minha opiniao. Sofia
E fizeste bem Sofia. A crítica é sempre bem vinda. Não creio ser miserabilismo, mas alguma fartura de ver as pessoas no meu país tristes, acomodadas e resignadas. Talvez seja uma questão geracional. Para miserabilismo à séria basta ver alguns trechos do documentário "Portugal, retrato social" de António Barreto. Já Chinatown não é aqui de forma nenhuma um insulto. Talvez o termo mais correcto seja bazar chinês. Assim será corrigido o texto, para evitar mal-entendidos. A culpa não é dos chineses, obviamente, mas dos portugueses que não tiveram pedalada para reanimar o comércio tradicional sobretudo nos bairros populares. Isso sim um caso de miséria. São constatações, mesmo que superficiais, mas não apreciações ideológicas.
Olá Popeline,
Sou eu outravez:-) Obrigada pela resposta, compreendo o que dizes e concordo. Sofia
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